01 de julho de 2021
Por Andressa Villagra
No mês de junho, o Ministério da Saúde publicou uma portaria que determina mudanças no cadastro de novos possíveis doadores de medula óssea no registro brasileiro (REDOME). As mudanças reduzem a idade máxima para cadastro para 35 anos de idade e modificam o modo como é feito o exame de tipagem HLA que passa a ser feito por meio de sequenciamento, tecnologia mais atual e detalhada.
A tipagem da compatibilidade do doador que será colocada no REDOME será mais robusta do que antigamente. No início quando se formaram os primeiros registros de doadores de medula óssea, conhecia-se muito pouco sobre a compatibilidade e por isso o tipo de tipagem que era feito era mais simples por meio de sorologia. De lá para cá, a tecnologia se desenvolveu muito, descobriu-se que quanto melhor a compatibilidade entre o doador e o receptor, melhor é o resultado do transplante.
Segundo a médica hematologista, Dra Carmen Vergueiro, “o que o doador pode oferecer de melhor para o paciente é a melhor compatibilidade possível”. A médica, que foi responsável pelo cadastro de doadores no hemocentro da Santa Casa de São Paulo por anos, explica que “essa busca pelo melhor doador, com a melhor resolução, com a melhor compatibilidade serve para que os pacientes tenham mais chance de sobreviver ao TMO”.
A tipagem que será feita nos novos doadores cadastrados será por uma técnica de biologia molecular chamada sequenciamento, o que impacta no resultado do transplante, pois ao melhorar a tipagem, mais rápido é possível eleger o melhor doador, isso agiliza o tempo para o paciente chegar ao transplante. Com o exame mais detalhado sendo feito no cadastro, não é preciso chamar o doador novamente para colher uma nova amostra e fazer um exame estendido, o que acontecia até hoje no processo de doação. Dessa maneira, uma das etapas que o paciente precisa aguardar até que se firme a compatibilidade do doador vai diminuir, assim o tempo de espera para o paciente diminui.
A redução na idade máxima para cadastro é uma tendência mundial nos registros há algum tempo. O registro canadense já diminuiu a idade para 40 anos há cerca de 10 anos, os registros americano e alemão também reduziram. Essa mudança aconteceu, porque começou-se a perceber que os resultados com o TMO, quando o doador era mais jovem, eram melhores. Segundo pesquisas da área, as taxas de mortalidades são mais baixas quando o doador não-aparentado é mais jovem, do que quando se usa doadores mais velhos. E esses resultados foram se consolidando ao longo do tempo, o pesquisador C. Kollman publicou em 2016, na revista Blood, resultados que mostravam que para cada 10 anos a mais na idade de um doador a taxa de mortalidade do paciente transplantado aumenta em 5,5%.
Segundo dados da plataforma criada pela AMEO, no âmbito do PRONON, a taxa de mortalidade tem crescimento significativo quando o transplante é feito com doadores com idade acima de 30 anos. Em 64 pacientes de LLA (Leucemia Linfoide Aguda) que fizeram transplante com doador voluntário não-aparentado (do REDOME) com idade abaixo de 30 anos, a taxa de sobrevida global em um ano é de cerca de 80%. Enquanto em 10 pacientes com as mesmas condições, mas que tiveram um doador não aparentado de idade acima de 30 anos, a taxa de sobrevivência em um ano diminui para 60%.
Taxa de sobrevida de pacientes de LLA com doador não-aparentado abaixo de 30 anos
Taxa de sobrevida de pacientes de LLA com doador não-aparentado acima de 30 anos
Muitas pessoas encararam as mudanças com negatividade. A médica esclarece que isso ocorre por falta de informação. “São assuntos muito técnicos, para quem acompanha o dia a dia do transplante essas informações não são novidades. Se as pessoas conseguirem entender o motivo das mudanças, não tem motivo para ser contra, já que todos somos a favor do paciente”, destaca ela. Hoje, quando existe a opção de mais de um doador, ao selecionar os doadores não-aparentados, os médicos já dão preferência a doadores mais jovens, porque o resultado do transplante é melhor.
A hematologista ressalta que o que será limitado será a idade dos novos cadastrados e não o número de cadastros. “A doação é em benefício do paciente e, por isso, a doação precisa ser adequada ao que conhecemos hoje, buscando o melhor resultado possível. O programa de transplante atende às necessidades dos pacientes” explica Dra Carmen Vergueiro.
“No começo pode haver uma queda no número de cadastros, por isso é preciso se adaptar a essa realidade para que o número de novos cadastros volte ao que é hoje. É, portanto, preciso mudar de estratégia na captação de doadores e focar mais na população jovem. Esta é uma mudança de qualidade que trará benefícios aos nossos pacientes.”