Fabrícia Santiago Chagas, 43 anos, professora e mãe do Vinicius Chagas Damásio, de 4 anos, ambos moram na cidade de Crixás em Goiás.
O diagnóstico de Anemia Falciforme foi assustador pra mim, porque eu descobri no teste do pezinho, até então eu nunca tinha ouvido falar nessa doença, que não é muito divulgada. Ele teve uma alergia da proteína do leite e até os 6 meses eu foquei muito nessa questão. Ele já chorava muito, mas eu não identificava que era por causa da Anemia Falciforme, pois ele também tinha os sintomas da alergia do leite.
Na época, entrei no Google para procurar sobre Anemia Falciforme, e só falava “Não tem cura”, “Não tem cura”, “Não tem cura”, “Não tem cura”. Mas desde que eu descobri sobre a doença, eu sempre falava: “Deus cura”, “Deus cura”, “Deus cura”, “Deus cura”. Eu sempre falei muito isso.
Como ele é autista, ele parecia sentir muito mais dor do que as outras crianças que estavam lá no hospital se tratando da Anemia Falciforme também. A nossa rotina foi de morar no hospital desde que ele nasceu. A gente não vivia, nós sobrevivíamos. Não podíamos fazer planos, não podíamos marcar um aniversário. Porque ficávamos todo mês no hospital, desde que o Vinicius nasceu, não teve um mês que ele não ficou internado.
Nós começamos o tratamento para Anemia Falciforme e começaram a aparecer os sintomas. Ele sentia dores muito fortes, quando eu ia colocar roupa nele e esticava as mãozinhas, ele chorava. As mãos dele inchavam, saíam bolhas nas mãos e nos pés. Ele teve pneumonia. Depois ele teve AVC. Ele teve dois sequestros esplênicos.
Foram várias crises da doença e chegou um tempo que eu pensei: “O que vai vir agora?”. Essa doença causa crises muito perigosas. Eu pensava: “Será que na próxima ele vai aguentar?”. Até que ele teve o primeiro sequestro esplênico e a hematologista me falou pela primeira vez na possibilidade de transplante de medula óssea. Quando ela falou pra mim, eu nunca mais tirei isso da minha cabeça. Eu pensei: “Eu vou fazer esse transplante, nem que eu tenha que ir até o fim do mundo, vou fazer, custe o que custar, eu vou curar meu filho”. Coloquei isso na minha cabeça e eu consegui!
Ele é autista, nunca consegui fazer nenhum tipo de terapia com ele, por causa das constantes internações. Eu marcava uma consulta na fonoaudióloga, ia duas vezes e parava de ir, porque ele era internado. Queria curá-lo da Anemia Falciforme para tentar tratar o autismo dele. Então, desde que a minha médica falou sobre o transplante, eu comecei a pesquisar, estudar sobre isso. Todos os dias da minha vida eu pensava em curar meu filho. Mas não tinha a indicação do transplante, porque ele ainda não tinha 5 anos, a médica dizia que ele não ia aguentar.
Quando ele teve o AVC, eu pensei que tinha chegado no fim do poço. Se eu não conseguisse o transplante depois daquele momento, eu não sabia se na próxima crise que ele tivesse, se não ia perder meu filho. Não houve sequelas, mas para mim foi muito difícil. Me senti de mãos atadas. Uma sensação de impotência muita grande. Foi a vez que eu mais tive medo, mas também foi a vez que mais tive fé. O AVC foi um divisor de águas, porque foi ali que eu comecei a correr mais atrás do transplante.
Por conta própria comecei a ligar para os centros de transplante do Brasil para buscar algum lugar que fizesse o transplante. Eu sabia que o transplante era a cura. Fui para Curitiba, fui para Brasília. Só ganhei “nãos” até que na Beneficência Portuguesa em São Paulo o médico aceitou fazer. Foi uma verdadeira odisseia. E se ali não desse certo, eu iria para Ribeirão Preto, iria para outros lugares, até para os Estados Unidos, até conseguir.
Depois do transplante, lá mesmo no hospital, quando ele recebeu a infusão, alguns dias depois eu já uma melhora muito grande. Eu percebi que ele ficou sem dor. Ele ficou mais ativo, mais corado, mais disposto, mais alegre, corre, pula, brinca mais. Ele chutou uma bola pela primeira vez. A resposta dele ao transplante foi 100% positiva.
Meu filho não fala, mas acho que se ele pudesse falar, ele me agradeceria por eu nunca ter desistido.